quarta-feira, 14 de junho de 2017

MARCELO COELHO, EM ARTIGO ANTOLÓGICO: "É A SOCIEDADE INTEIRA QUE ESTÁ EM FRANCO PROCESSO DE DESMORALIZAÇÃO".

"Desânimo total"
NÃO SÓ O TSE, MAS TODOS OS
LADOS SAEM DO JULGAMENTO
DE TEMER SOB SUSPEITA.
Tento tirar algumas conclusões a partir da vitória de Michel Temer no TSE, mas escrevo num estado de desânimo total. Não foram apenas os políticos que, em sua maioria, perderam o pouco de cuidado ético que ainda pudessem ostentar. É a sociedade inteira que está em franco processo de desmoralização.

Começo com o julgamento no Tribunal Superior Eleitoral.

Acompanhei ao longo de todos aqueles dias o voto do ministro Herman Benjamin, que, com infinita paciência e ampla acumulação de provas, deixou claro, ao menos para mim, que não havia argumento para inocentar a chapa Dilma-Temer.

Ele pôs por terra a ideia de que seu voto se baseava apenas na palavra de delatores. Apresentou provas e provas. Eram planilhas com os pagamentos, depósitos bancários em contas no exterior, conversas por e-mail, até papéis manuscritos evidenciando os acertos irregulares de campanha.

Pouco importou. O ministro Napoleão Maia, sem dúvida o mais folclórico do grupo, insistiu na tese da delação premiada, como se não tivesse ouvido nada do que estava no voto de Herman Benjamin.
Napoleão Maia, "o mais folclórico do grupo"

Outros se aferraram à versão de que a causa extrapolara seus objetivos iniciais. Mas Herman Benjamin demonstrara rigorosamente que esse não era o caso; para refutá-lo, teriam sido necessários mais três dias de debate, sem garantia de sucesso.

Melhor seria mandar às favas todos os fatos e concentrar-se apenas no aspecto político da coisa, o que fez em grande parte Gilmar Mendes.

Não se trata de um processo qualquer, argumentava. Não se tira um presidente da República na base do tapetão. E, em tese, acho que ele está certo nesse ponto.

Por que, então, não ter interrompido o processo quando a relatora do caso, em 2015, votara pelo seu arquivamento? Gilmar Mendes disse que, naquele momento, havia motivos para investigar melhor as acusações.

Do mesmo modo, argumentou, magistrados aceitam uma denúncia, transformando alguém em réu, e mais tarde acabam por inocentá-lo.

Sim. É o que ocorre num processo criminal qualquer. Mas Gilmar Mendes também tinha dito que aquele não era um processo qualquer...
"A enorme lambança com a Odebrecht foi diretamente gerida pelo PT e seus italianos"
Minha convicção é que se usava contra Dilma Rousseff, em 2015, de um rigor que se abandonou contra Michel Temer.

Todo o processo foi uma molecagem, uma irresponsabilidade, uma aventura golpista do PSDB –que, como sempre, ostenta uma aura de respeito que só possui entre os tomados de voluntária cegueira direitista.

Ainda assim, uma estranha justiça terminou sendo feita. Pois a enorme lambança com a Odebrecht foi diretamente gerida pelo PT e seus italianos, pós-italianos, ex-moralistas e pós-trotskistas. Por que Temer teria de pagar o pato?

Quem queria agora a cassação de Temer estaria provavelmente defendendo Dilma se o processo tivesse ocorrido em 2015 –como sugeriu Gilmar Mendes em entrevista à Folha, aproveitando para desacreditar três de seus colegas no STF.
"Política dominada pelos grandes interesses empresariais"
A Justiça se desmoraliza, é claro, quanto mais se imbrica numa vida política dominada pelos grandes interesses empresariais. Tanto com Temer quanto com Dilma.

Muitos petistas não admitem essa constatação. Mas, para tirar Temer, baseiam-se nas provas de que Odebrecht corrompeu o governo Dilma! É um paradoxo e tanto.

Depois de um impeachment baseado no pretexto das pedaladas fiscais, a direita reza por Temer, baseada na tese sacrossanta do mandato popular. Em nome do combate à corrupção, milhões se mobilizaram contra Dilma –e ficam em casa a favor de Temer.

Sob o nome mandato popular, o que se faz é defender a reforma da Previdência. Se, para aprovar a pauta fosse necessária a intervenção do Exército, muitos de nossos liberais não hesitariam em convocá-lo.

Já não vimos, sem maior escândalo, a PM usar armas de fogo numa manifestação anti-Temer? E que democratas são esses manifestantes, incendiando o que veem pela frente?

Tatua-se na testa de um delinquentezinho a frase sou ladrão; fariam isso na testa de qualquer político, sem saber que na própria está dito votei nele.

O golpista vira democrata, o golpeado quer o golpe. O torturador defende a lei, o jurista inventa um jeitinho. A esquerda ajuda a Odebrecht a sonegar imposto e a direita se aproveita do resultado. Os desmoralizados dão lição de moral.

Quem quiser falar em princípios ou em coerência, nesse clima, corre o risco de falar sozinho. (por Marcelo Coelho)

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